O meu nacionalismo corre nas
veias: rápido, sincero, pulsante. Hoje, ouvi no rádio um cantor negar o próprio
português e então corri para o meu armário e vesti a minha capa verde amarela:
aquela que escondi no último sete a um. Admirei o meu reflexo no espelho, tão made in Brazil, e corri para o mundo
obedecendo à vontade de provar que não sou menos culto que um europeu. O inglês
é universal, mas eu sou dono das minhas escolhas. Saí, indignado. O meu grito
percorreu ruas, favelas, Planalto Central. Alçou vôo. Reuni multidões a favor
da minha causa nacionalista. Lutei.
Na Câmara Federal, o projeto de lei
4330 está escrito em português. No entanto, o texto não causou em mim tanta
indignação quanto a declaração daquele cantor que ouvi no rádio. E daí se esses
quatro números representam um retrocesso na causa trabalhista nacional ou se o
salário de 18 milhões de brasileiros poderá diminuir significativamente? Nesse
texto, ninguém critica a minha camiseta apertada, o meu gosto por futebol ou o
meu relógio branco. Nesse texto – que, repito, está escrito em português –, ninguém
ofendeu minha pátria amada Brasil. E, mais importante: nesse texto, NINGUÉM
duvidou da minha inteligência ou poder de escolha.
O meu nacionalismo corre nas
veias: rápido, sincero, pulsante. Dona Terezinha (vocês ainda se lembram dela?)
mudou-se para o Piauí depois de ver o seu Eduardo ser atingido por um PM no
Complexo do Alemão. Dona Terezinha fala português e também faz parte da “turma
simplória” sobre a qual falou o cantor do rádio. Pobre Dona Terezinha pobre.
Será que ela também se indignou por não poder ir ao show de jazz na Europa? Não
importa. Eu me indignei por ela.
Foto: Poracaso.com |
Às vezes, a minha capa verde e
amarela me aperta um pouco. Esse cheiro de naftalina impregnado no seu tecido
me dá dor de cabeça. Mas um filho teu não foge à luta e, então, cá estou, hino
nacional a punho, com muito orgulho, com muito amoooooor. Vou guardar a minha
capa dentro de alguns dias, logo que o auê passar. Mas, oh: se aparecer qualquer
coisa pela qual precise me indignar, me chamem! Coloco a capa de volta,
brasilindo que sou, e saio por aí cantando Imagine: I’m a dreamer...