domingo, 25 de setembro de 2011

A primeira crônica



            O ser humano sempre valorizou o final das coisas. Talvez pelo mistério da morte – fim de tudo, talvez porque seja esse o grande desafio da humanidade: dar fim ao fim. Já inventaram-se  máquinas, gramáticas, religiões, nações... mas até hoje ninguém soube inventar a cura pra teimosia que o tempo tem de passar e levar consigo os dias, as pessoas, as ideias, os fatos.
            Talvez por isso, por essa submissão a que todos estamos incluídos, a expectativa pelo “fim”, pelo “último” é sempre muito grande. “Devemos viver cada dia como se fosse o último”; “Assim eu quereria meu último poema”;  “O mundo acaba ano que vem?”
            Esse culto à transitoriedade de tudo nunca me pertenceu.   O início das coisas é tão mais gostoso!  Por que não viver o dia como um re-começo? O início é sempre uma oportunidade. O fim? Ah, o fim é uma saudade, um arrependimento, nostalgia...  Às vezes é bom esquecer que tudo tem seu tempo e que todo tempo tem seu final.
            Foi com o frio na barriga dos começos e com o empenho dos iniciantes que passei uma semana procurando um tema para a minha primeira crônica. Sete dias olhando cada situação como uma proposta. Um policial armado andando pela rua à noite? Crônica! Um palco vazio, por trás de um palestrante? Crônica! O nascimento da flor do meu pé de trevos de quatro folhas? Crônica! Uma roda de violão? Crônica! Mas nada mostrou-se tão importante para a minha primeira crônica quanto a minha primeira crônica.
            A vontade de saber encaixar as palavras de um jeito saboroso, a responsabilidade de estrear bem, o medo de ter meus parágrafos abandonados antes do final,  e, sobretudo, a humilde pretensão, se é que isso é possível, de causar em quem ler o desejo de fazer do agora sempre uma estreia.
            Assim eu quis a minha primeira crônica. E, por hora, isso basta. Talvez pela imortalidade que a juventude me dá, talvez por não cogitar abrir mão da paixão pela escrita, ou quem sabe, por ter o privilégio de não me preocupar com o futuro, mantenho a certeza que minha última crônica não virá. Não importa se for a segunda, a vigésima ou a última: todas as minhas crônicas serão sempre a primeira. Serão sempre a minha estreia. Esse frio na barriga? Essa incerteza do que relatar? Esse olhar inocente, ainda que não ingênuo? Estarão sempre comigo.
            Mais do que técnica, a crônica é tato, sentimento. Se daqui a muitos anos, as minhas palavras não se deixarem envelhecer pelos cansaços desse mundo e eu conseguir transmitir esse entusiasmo de hoje, não terei muito mais o que pedir. As chances para isso são muitas, afinal, cada vez que eu me sentar para escrever será a primeira vez, será uma chance.
            A vontade sincera desse meu início? Que seja crônica.   

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