O ser
humano sempre valorizou o final das coisas. Talvez pelo mistério da morte – fim
de tudo, talvez porque seja esse o grande desafio da humanidade: dar fim ao
fim. Já inventaram-se máquinas,
gramáticas, religiões, nações... mas até hoje ninguém soube inventar a cura pra
teimosia que o tempo tem de passar e levar consigo os dias, as pessoas, as
ideias, os fatos.
Talvez
por isso, por essa submissão a que todos estamos incluídos, a expectativa pelo
“fim”, pelo “último” é sempre muito grande. “Devemos viver cada dia como se
fosse o último”; “Assim eu quereria meu último poema”; “O mundo acaba ano que vem?”
Esse
culto à transitoriedade de tudo nunca me pertenceu. O início das coisas é tão mais gostoso! Por que não viver o dia como um re-começo? O
início é sempre uma oportunidade. O fim? Ah, o fim é uma saudade, um
arrependimento, nostalgia... Às vezes é
bom esquecer que tudo tem seu tempo e que todo tempo tem seu final.
Foi
com o frio na barriga dos começos e com o empenho dos iniciantes que passei uma
semana procurando um tema para a minha primeira crônica. Sete dias olhando cada
situação como uma proposta. Um policial armado andando pela rua à noite?
Crônica! Um palco vazio, por trás de um palestrante? Crônica! O nascimento da
flor do meu pé de trevos de quatro folhas? Crônica! Uma roda de violão?
Crônica! Mas nada mostrou-se tão importante para a minha primeira crônica
quanto a minha primeira crônica.
A
vontade de saber encaixar as palavras de um jeito saboroso, a responsabilidade
de estrear bem, o medo de ter meus parágrafos abandonados antes do final, e, sobretudo, a humilde pretensão, se é que
isso é possível, de causar em quem ler o desejo de fazer do agora sempre uma
estreia.
Assim
eu quis a minha primeira crônica. E, por hora, isso basta. Talvez pela
imortalidade que a juventude me dá, talvez por não cogitar abrir mão da paixão
pela escrita, ou quem sabe, por ter o privilégio de não me preocupar com o
futuro, mantenho a certeza que minha última crônica não virá. Não importa se
for a segunda, a vigésima ou a última: todas as minhas crônicas serão sempre a
primeira. Serão sempre a minha estreia. Esse frio na barriga? Essa incerteza do
que relatar? Esse olhar inocente, ainda que não ingênuo? Estarão sempre comigo.
Mais
do que técnica, a crônica é tato, sentimento. Se daqui a muitos anos, as minhas
palavras não se deixarem envelhecer pelos cansaços desse mundo e eu conseguir
transmitir esse entusiasmo de hoje, não terei muito mais o que pedir. As
chances para isso são muitas, afinal, cada vez que eu me sentar para escrever
será a primeira vez, será uma chance.
A
vontade sincera desse meu início? Que seja crônica.
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